A batalha mais difícil também tem a recompensa mais importante: a vida

A batalha mais difícil também tem a recompensa mais importante: a vida

Nathan é um bebê bem pequeno e usa sonda. Ele está no colo da mãe, Raissa, que veste roupa do hospital na cor cinza, e sorri.

Nathan, ainda na UTI, recebendo o amor da mãe. Foto: acervo da família

Chapecó/SC

A prematuridade trouxe riscos e complicações ao bebê. A mãe, com 16 anos de idade, precisou reunir forças e enfrentar tudo com fé, dedicação e muito amor.

A Raissa nasceu em Chapecó, mas morou no Mato Grosso dos dois aos 15 anos de idade, quando voltou para o Oeste Catarinense junto com a mãe, para morar no interior de Nova Itaberaba e ficar mais próxima do avô, após o falecimento da avó materna.

Em seguida, o pai e o irmão dela também vieram para Santa Catarina e a família optou por estabelecer residência em Chapecó, onde a menina passou a estudar. Foi neste período que ela conheceu o Joel e começaram a namorar. Com apenas três meses de namoro, a Raissa engravidou. Ela tinha 15 anos e o namorado, 17.

Apesar do medo e da vergonha que sentia pela gravidez precoce, a Raissa encontrou na família todo o apoio que precisava. E assim, aos poucos, aceitou a nova fase e a maternidade, principalmente depois de escutar os batimentos do coraçãozinho do filho pela primeira vez e depois de se emocionar ao sentir os movimentos do bebê na barriga.

Pressionados pela família, os jovens se casaram, mas sem emprego e dependentes dos pais, o casal seguiu morando separado, cada um na casa da sua família. Eles se visitavam e seguiram com o relacionamento por dois anos, até que optaram por uma separação amigável.

O casamento foi no fim do mês de agosto e dez dias depois o Nathan Augusto nasceu, com apenas 24 semanas de gestação. Naquele sete de setembro, as dores iniciaram por volta das sete horas da noite e seguiram até as onze, quando a jovem resolveu ir pro hospital.

Ela foi imediatamente encaminhada para o setor obstétrico e, enquanto aguardava na sala de avaliação para ser atendida, percebeu que estava em trabalho de parto e o bebê ‘estava saindo’. O parto foi ali mesmo, na maca, na sala de avaliação, as 00h50. Imediatamente levaram o recém-nascido para a UTI, sem que ao menos a mãe pudesse vê-lo ou tocá-lo. O bebê media 34 centímetros, pesava 900 gramas e começava naquele instante a travar uma incansável batalha pela vida.

Prematuridade, sustos e fé

A Raissa só conseguiu ver o filho no dia seguinte ao parto. A angústia era saber se ele iria sobreviver, pois o bebê, tão pequeno, precisava reagir, especialmente nas primeiras horas de vida.

“Vendo ele naquela situação, cheio de aparelhos e tão pequeno, só pedia a Deus para que guardasse a vida do meu filho. E assim foi. Aos pouquinhos ele foi ganhando peso e evoluindo. No início só podíamos olhar para ele. Com duas semanas de vida eu e o pai dele começamos a tocar no nosso bebê. Com um mês e meio, finalmente pude pegar meu pequeno nos meus braços por algumas horas”.

Raissa Romanoski, mãe do Nathan.

A temporada do Nathan no hospital durou três meses, sendo dois deles na UTI Neonatal. A jovem mãe voltou para a escola pra concluir o ano letivo e visitava o filho duas vezes por dia, conforme estabelecido pelo Hospital, levando o leite materno para ele tomar por meio de sonda. Ao longo desse período, ela pesquisou sobre maternidade e prematuridade, treinou os cuidados com o bebê de uma prima e pediu a Deus que o filho ficasse bem.

A temporada do Nathan no hospital durou três meses, sendo dois deles na UTI Neonatal. A jovem mãe voltou para a escola pra concluir o ano letivo e visitava o filho duas vezes por dia, conforme estabelecido pelo Hospital, levando o leite materno para ele tomar por meio de sonda. Ao longo desse período, ela pesquisou sobre maternidade e prematuridade, treinou os cuidados com o bebê de uma prima e pediu a Deus que o filho ficasse bem.

“Durante todo esse tempo, ele ainda não tinha nome. Na última noite no hospital antes de ter alta, Deus me mostrou em sonho o nome Nathan Augusto, que acabei escolhendo para o meu filho.

Nathan Augusto é um nome forte, principalmente pelo seu significado: ‘presente de Deus para nossa vida’.”

Nathan é um bebê bem pequeno e usa sonda. Ele está no colo da mãe, Raissa, que veste roupa do hospital na cor cinza, e sorri.
Nathan, ainda na UTI, recebendo o amor da mãe.
Foto: acervo da família

O diagnóstico inicial do Nathan apontava Paralisia Cerebral e a primeira notícia que a família teve a respeito de alguma deficiência no menino foi relacionada à visão. Um médico oftalmologista diagnosticou o Nathan com retinopatia da prematuridade – uma doença que pode causar até mesmo a perda da visão.

Para minimizar as consequências, uma cirurgia precisava ser feita em um prazo de uma semana. Porém, o Nathan teve uma infecção e não foi liberado para a cirurgia dentro do prazo – precisou fazer a operação uma semana depois e não teve o sucesso desejado. O bebê precisou passar por outros dois procedimentos para ter uma visão parcial: enxerga luzes e vultos.

Pouco depois da cirurgia, o bebê saiu do hospital, dia 15 de dezembro. O presente de Natal da Raissa foi antecipado e o melhor que ela poderia desejar: finalmente poder levar o filho para casa.

Ansiosos por receber o Nathan em casa, desde o começo, todos se empenharam para cuidar do menino. A Raissa conseguiu terminar o Segundo Ano do Ensino Médio, em meio à gestação, parto e hospital. No começo do Terceiro Ano, a mãe dela levava o bebê na escola para ela amamentar. Foi assim que concluiu o Ensino Médio, com dificuldade, mas com muito apoio da família; conciliando os estudos com a maternidade atípica e as terapias do menino.

Por ter nascido prematuro, o menino foi encaminhado para diversos centros de atendimento a pessoas com deficiência. Um deles foi o Capp (Centro Associativo de Atividades Psicofísicas Patrick, em Chapecó/SC). No local, ele começou atendimento com fisioterapeuta, fonoaudióloga e atividades de integração sensorial.

Nas terapias, surgiu a dúvida sobre a audição. Nos testes clínicos ele reagia aos sons, mas nos testes de cabine foi detectado que o menino não escutava. Com um ano de idade, recebeu o diagnóstico de perda profunda bilateral. Ele só escuta sons muito intensos, como ruídos e tons de voz altos.

“Por um lado, eu me apavorava sobre como ia conseguir lidar com um bebê que não enxergava. Por outro lado, eu me apegava ao fato de que ele não via, mas podia ouvir. Então, quando veio a notícia do problema de audição, meu mundo desabou totalmente.

Desde que engravidei eu pensava que não ia conseguir cuidar de uma criança, que ia atrapalhar a minha vida na escola. E de uma hora para outra tudo isso mudou. Eu não só me tornei mãe – de verdade e com todo o amor – como me tornei mãe de uma criança especial”.   

Quando tinha dois anos de idade, o Nathan foi encaminhado para fazer a cirurgia de implante coclear (aparelho eletrônico digital utilizado para restaurar a função auditiva), mas a Raissa ficou com medo e desistiu do procedimento por influência de pessoas que disseram que havia muito risco de não dar certo. Temendo pela saúde e integridade do filho, ela optou por não fazer naquele momento. Mais tarde, a Raissa conheceu crianças com o implante que tiveram sucesso na cirurgia e acabou se arrependendo. Agora, a família está há três anos na fila de espera para tentar fazer o procedimento pelo SUS.

Dificuldades, avanços, aprendizado e alegrias

O primeiro contato da família com uma instituição de ensino foi frustrante: na creche, só deixavam o menino deitado em um colchonete, sem qualquer estímulo; não fazia atividades, nem brincava. Felizmente, a família encontrou porto seguro em outra instituição.

A escola em que o Nathan estuda possui equipe capacitada e materiais adaptados, em alto relevo e em E.V.A., tudo dentro do conteúdo escolar. Ele está no Quinto Ano, sempre com a mesma turma, que já o conhece, auxilia e entende as necessidades e potenciais. Está aprendendo Libras Tátil – um método da Língua Brasileira de Sinais adaptado ao tato – e faz alguns gestos: para pedir comida, ir ao banheiro, passear e também aprendeu o sinal da cruz.

A rotina do Nathan engloba muito mais do que somente as aulas. Ele tem uma agenda cheia: além da escola, se divide entre fisioterapia, equoterapia, terapia ocupacional, sessões com a fonoaudióloga, atividades na Adevosc (Associação dos Deficientes Visuais do Oeste de Santa Catarina), aula de Libras, e sala de recursos.

Nathan é um menino que emite sons, faz cara de choro, sorri e sabe se expressar, a seu modo, através dos sinais. Com as terapias, foi possível rolar, sentar, engatinhar e até mesmo dar alguns passinhos com apoio. Em março deste ano foi submetido a uma cirurgia para corrigir os dois pés, pois caminhava com o pé torto. Ainda está em recuperação e reabilitação.

Aos dez anos de idade, Nathan é encantador e de personalidade forte. Ele é doce, mas também é valente e não gosta de ser contrariado.

Por enquanto, o menino ainda passa a maior parte do tempo com a avó. A mãe trabalha em horário comercial. Depois das 18h, a Raissa se dedica a dar atenção pro Nathan: brincar, dar banho e comida e, alguns dias da semana, acompanhar o filho nas sessões de fisioterapia. Na rotina, ainda tem espaço para o atual companheiro e a filha do casal, Luiza Helena, de três anos.

A família está sentada em um gramado. Marcelo está ao lado de Raissa e as crianças (Nathan e Luiza) em frente, entrelaçadas.
Nathan com a mãe, o padrasto e a irmã.
Foto: acervo da família

Meses depois que me separei do pai do Nathan, conheci o Marcelo. Estamos juntos há oito anos. Ele é a pessoa que me ajuda e me apoia em todas as decisões e tem um amor enorme pelo Nathan. Ele me aceitou e, principalmente, aceitou o Nathan mesmo sabendo de todas as deficiências que ele tinha.

Quando engravidei da Luiza fiquei muito preocupada, passava mil coisas na minha cabeça. Eu chorava dia e noite com medo do que poderia acontecer. Meu coração só acalmou na ultrassonografia morfológica que mostrou que estava tudo bem.

Mesmo assim eu ainda tinha muito medo do parto. Do sexto pro sétimo mês eu estava com dilatação e precisei ficar em repouso absoluto até ela nascer. Optei por fazer uma cesárea, antes do previsto, pois estava com pressão alta. A Luiza nasceu com 54 cm e com 3,7 kgs. Foi uma experiência muito diferente”.

Raissa Romanoski, mãe do Nathan e da Luiza.

Após o nascimento da Luiza, outro susto. Desta vez, quem corria risco era a própria Raissa. Quatro dias depois do parto, em casa, sentiu que não conseguia deitar porque faltava o ar.  Tossia, não conseguia falar, nem mesmo respirar direito. Foi para o hospital com pressão alta e batimentos alterados. Os médicos a diagnosticaram com miocardiopatia periparto (insuficiência cardíaca materna no último mês de gestação ou em até cinco meses após o parto) relacionada à retenção de líquido, que acabou acumulando no pulmão.

No hospital, a Raissa foi direto para a UTI. Ficou em coma, desacordada, por 24 horas e em observação por cinco dias. Durante a internação foi descoberto um sopro no coração – uma válvula com capacidade reduzida para a passagem de sangue –, e ela precisou fazer tratamento contínuo para pressão alta.

O episódio assustou toda a família, mas agora faz parte do passado. Hoje, a jovem de 26 anos está formada em Administração, trabalha e se reveza no cuidado com os filhos. Ela percebe com tranquilidade as diferenças entre os dois e respeita o tempo de cada um. Os irmãos brincam juntos e a pequena Luiza já compreende as limitações do Nathan e, através das brincadeiras, contribui para que ele se desenvolva melhor e ainda mais feliz.

Depois de tudo o que passou, Raissa aprendeu a dar valor às coisas simples e aos bons momentos. As dificuldades ensinaram sobre a vida, sobre o amor e sobre a felicidade, que está nas pequenas conquistas diárias.

“Não existem palavras suficientes para descrever todo esse sentimento de amor e gratidão. Ser mãe é ter um pedaço seu fora do corpo. É poder cuidar, proteger e enfrentar tudo com outros olhos.

Hoje posso dizer que não foi fácil passar por tudo isso, mas valeu a pena. 

A recompensa é chegar em casa e saber que tenho duas pessoas me esperando com um sorriso no rosto e me chamando da palavra mais linda do mundo: mãe”.

Raissa Romanoski, mãe do Nathan Augusto e da Luiza Helena.

Raissa, sentada em um gramado, com os filhos Nathan Augusto e Luiza Helena.
Raissa encara os desafios e aproveita os bons momentos da maternidade.
Foto: acervo da família